"O operário que quer fazer o seu trabalho bem deve começar por afiar os seus instrumentos."
Confúcio

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

A indenização por danos em caso de falecimento do trabalhador (legitimidade)

Olá pessoal,
bomm diaaaa!

Hoje vamos falar mais uma vez da Competência da Justiça do Trabalho, quem está acompanhando o blog e lendo as sugestões de artigos que tenho indicado com certeza já percebeu que a EC nº 45/2004, veio para chancelar as competências da JT que não são poucas. 
A turma de DPT-I no dia 03-09  teve como um dos assuntos da aula expositiva a Representação. Deste modo, vamos abordar um assunto super interessante, qual seja: A indenização por danos em caso de falecimento do trabalhador.

Vou colacionar parte de um material que pesquisei e que por sua vez é bastante esclarecedor. É a análise de processo feito de forma didática pelo Juiz Maurício M. Marca da 1ª Vara do Trabalho de Bento Gonçalves/RS- Processo nº 00699.2006.511.04.00.4, neste processo é alegado em sede de preliminar a incompetência material da Justiça do Trabalho, estejam atentos aos julgados contidos na análise, a coerencia que eles juntos produzem! Quem tiver interesse em ler o material na íntegra é só acessar a página:  http://www.amatra4.org.br/publicacoes/cadernos/caderno-04?start=6 

Bons Estudos!

B. PRELIMINAR
1. COMPETÊNCIA MATERIAL
1.1. ÓBITO DA VÍTIMA DE ACIDENTE – SUCESSÃO – DIREITO DO    DE CUJUS
Em sede de preliminar não cabe discutir a transmissibilidade da indenização patrimonial do dano moral aos sucessores. A petição inicial ao alegar que o de cujus sofreu dano moral próprio decorrente do acidente de trabalho apresenta postulação que se encaixa com perfeição na competência da Justiça do Trabalho, em absoluta identidade com qualquer outra parcela patrimonial não satisfeita durante a relação de emprego. A questão se a indenização pelo dano moral alegado na petição inicial poderia ou não ser transmitida à sucessão é nitidamente de mérito: diz não sobre a competência, mas sobre a existência ou inexistência do direito alegado na petição inicial.
Para os que afirmam que o direito à indenização por dano moral não se transmite aos herdeiros, desaparecendo junto com o perecimento da personalidade ocorrido com a morte da vítima, não mais existe o direito próprio do de cujus alegado na petição inicial, mas somente o direito à indenização por dano moral reflexo ou por repique sofrido pessoalmente pelos sucessores. Não se discute que existiu uma relação de emprego entre a reclamada e o de cujus que gerou controvérsias e que para dirimi-las a única justiça competente é a do Trabalho.
Trata-se de raciocínio semelhante aos pedidos de reconhecimento de relação de emprego anteriores à Emenda Constitucional nº 45/2004. A inexistência da relação de emprego não resultava na incompetência da Justiça do Trabalho, mas na improcedência do pedido. Precisamente porque dizia respeito ao mérito da pretensão formulada pela parte na petição inicial. Da mesma forma que somente a Justiça do Trabalho tem competência para dizer a respeito da existência ou não da relação de emprego, tem competência para dizer sobre a existência ou não do direito a dano moral do empregado falecido em acidente de trabalho. O fato de o pedido ser formulado pelo empregado ou por sua sucessão é absolutamente irrelevante.
Neste sentido, embora invocando matéria de mérito, convergem os seguintes julgamentos, do Tribunal Superior do Trabalho, do TRT-RS e do Superior Tribunal de Justiça:
“INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAL E MORAL – ACIDENTE DE TRABALHO COM ÓBITO AÇÃO MOVIDA PELOS SUCESSORES – COMPETÊNCIA MATERIAL DA JUSTIÇA DO TRABALHO – I. É incontroversa a competência da Justiça do Trabalho para julgar ação de indenização por danos moral e material provenientes de infortúnio do trabalho quando movida pelo empregado. II. A competência material assim consolidada não sofre alteração na hipótese de, falecendo o empregado, o direito de ação for exercido pelos seus sucessores. III. Com efeito, a transferência dos direitos sucessórios deve-se à norma do art. 1.784 do Código Civil de 2002, a partir da qual os sucessores passam a deter legitimidade para a propositura da ação, em razão da transmissibilidade do direito à indenização, por não se tratar de direito personalíssimo do de cujus, dada a sua natureza patrimonial, mantida inalterada a competência material do Judiciário do Trabalho, em virtude de ela remontar ao acidente de que fora vítima o ex-empregado. Recurso desprovido” (TST – RR nº 165/2006-076-03-00, Rel. Min. Barros Levenhagen,                           DJ de 27.04.2007).
“ACIDENTE DO TRABALHO – MORTE DO EMPREGADO – INDENIZAÇÃO DE DANO MORAL E PATRIMONIAL VINDICADO PELA VIÚVA – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO – Os danos decorrentes de acidente de trabalho, inclusive a pretensão de dano moral e material vindicado pela viúva, se inserem na órbita de competência desta Justiça Especializada.Recurso provido.” (RO 00534-2006-811-04-00-7, Rel. Juiz Pedro Luiz Serafini).
“No caso, o empregado sofreu acidente no local de trabalho em razão do vínculo de emprego mantido com o empregador, vindo a falecer. Em razão disso, a ação objetivando a reparação material e moral foi ajuizada pela viúva e filhos. Ora, se o trabalhador não tivesse falecido e viesse ajuizar a ação reparatória, é inconteste que ele teria legitimidade para tanto e que seria competente esta Justiça Especializada. Ainda, se ele tivesse ajuizado a ação reparatória em função do acidente sofrido e viesse a falecer no curso da demanda, a titularidade passaria para a viúva e filhos (sucessão) e, do mesmo modo, não restaria dúvida de que competente esta Justiça do Trabalho. O fato em si, acidente do trabalho, que ocasionou o óbito do trabalhador permanece. Da mesmo forma, a competência para julgamento da ação reparatória dos danos materiais e morais oriundos de acidente do trabalho, conforme se infere do disposto nos arts. 7º, XXVIII e 114, da Constituição Federal, permanece com esta Justiça Especializada. Ademais, este último dispositivo constitucional não fixa a competência desta Justiça Especializada para julgar ações de indenização por danos materiais e morais decorrentes de acidente do trabalho em função da titularidade do direito de ação, mas sim em decorrência da relação de trabalho. Tanto é assim, que neste caso a Justiça Comum determinou a remessa dos autos a esta Justiça            do Trabalho (fl. 360, vol. II), visto que ajuizada a ação lá, originalmente.” (fundamentação do RO 00804-2005-662-04-00-5, relatado pelo Juiz Ricardo Carvalho Fraga – grifos no original).
“PROCESSUAL CIVIL – CONFLITO DE COMPETÊNCIA – INDENIZAÇÃO POR ACIDENTE DO TRABALHO – SERVIDOR PÚBLICO – ARTIGOS 109 E 114 DA CF – 1. O Supremo Tribunal Federal no julgamento do Conflito de Competência 7.204/MG entendeu que, mesmo antes de ser editada a Emenda Constitucional 45/2004, a competência para julgar as ações que versem sobre indenização por dano moral ou material decorrente de acidente de trabalho já seria da Justiça Laboral. (...). 4. Tem natureza trabalhista a reclamatória intentada pelos herdeiros do trabalhador falecido e em nome dele com o fito de ver reconhecida a indenização por danos morais e materiais ocasionadas por acidente de trabalho. (...) 6. Conflito de competência conhecido para declarar a competência do Juízo da 2ª Vara do Trabalho de Americana – SP, o suscitado.” (Conflito de Competência nº 61.587 – SP, Superior Tribunal de Justiça,                Rel. Min. Carlos Meira – grifo itálico nosso)
A se entender que a morte do empregado afasta a competência da Justiça do Trabalho forçosamente teriam que ser remetidas para a Justiça Comum Estadual todas as reclamações trabalhistas versando sobre os mais variados direitos previstos no art. 7º da CF/88 e na CLT cujo empregado não esteja mais com vida. Todos os processos e não somente os que versem sobre acidente de trabalho na medida em que não há diferença quanto à origem entre os créditos decorrentes do acidente com ou sem morte e os demais créditos oriundos da relação de emprego. Caso o empregado faleça no curso do processo, cessaria imediatamente a competência da Justiça do Trabalho. Seguramente não é esta a finalidade das alterações do art. 114 da CF/88 introduzidas pela Emenda Constitucional nº 45/2004.
Ainda que adotado entendimento restritivo às alterações do art. 114, I e IV da CF/88, a competência para decidir sobre a existência de créditos de titularidade material do empregado, exercido o direito de ação pelo empregado em vida ou pelos sucessores, é e sempre foi da Justiça do Trabalho.
1.2. INDENIZAÇÃO DOS FAMILIARES DO EMPREGADO POR DANO MORAL PRÓPRIO
O art. 114 da CF/88, com a redação anterior à Emenda Constitucional nº 45/2004, delimitava a competência da Justiça do Trabalho nos seguintes termos: “Compete à Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores (...)”. A dicção da norma constitucional reserva à Justiça do Trabalho desde a promulgação em 5 de outubro de 1988 a competência para julgar as ações decorrentes de acidente de trabalho movidas pelo empregado contra o empregador. Entre outros fundamentos, pela simples razão de que somente é acidente de trabalho o que ocorre entre empregado e empregador. Nada mais evidente para estabelecer a competência da Justiça do Trabalho nos casos de acidente de trabalho que a supressão da exceção contida no § 2º do art. 142 da CF/67 com a seguinte redação:
“Art. 142. Compete à Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre empregados e empregadores e, mediante lei, outras controvérsias oriundas de relação de trabalho. (...)
§ 2º Os litígios relativos a acidentes do trabalho são da competência da Justiça ordinária dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios, salvo exceções estabelecidas na Lei Orgânica da Magistratura Nacional”.
A este respeito leia-se o excelente artigo do Juiz do Trabalho Vander Zambeli Vale publicado na Revista LTr-Legislação do Trabalho nº 8, volume 60, agosto/96, página 1.069. A competência da Justiça do Trabalho para as ações decorrentes de acidente de trabalho entre empregado e empregador é sustentada por este Juízo desde o ingresso na magistratura, sendo exemplo as sentenças publicadas nos Processos           nº 00253-402-01-8 em 28.06.2001, nº 00015-402-02-9 em 31.07.2002, entre outras.
O Supremo Tribunal Federal no julgamento do Conflito de Competência              7204-01/MG afirma categoricamente o óbvio: a competência para julgar pedido de indenização por acidente de trabalho do empregado contra o empregador era desde 5.10.1988 da Justiça do Trabalho. Na fundamentação do voto o Ex.mo Min. Relator Carlos Ayres Brito destaca com todas as letras que:
“Com efeito, estabelecia o caput do art. 114, em sua redação anterior, que era da Justiça do Trabalho a competência para conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores, além de outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho. Ora, um acidente de trabalho é fato ínsito à interação trabalhador/empregador. A causa e seu efeito. Porque sem o vínculo trabalhista o infortúnio não se configuraria; ou seja, o acidente só é acidente de trabalho se ocorre no próprio âmago da relação laboral.(...)
Nesse rumo de idéias, renove-se a proposição de que a nova redação do art. 114 da Lex Maxima só veio aclarar, expletivamente, a interpretação aqui perfilhada. Pois a Justiça do Trabalho, que já era competente para conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores, além de outras controvérsias decorrentes da relação trabalhista, agora é confirmativamente competente para processar e julgar as ações de indenização por dano moral              ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho (inciso VI do art. 114)” (grifos nossos).
Diante de tais constatações indaga-se: será que nada mudou com a edição da Emenda Constitucional nº 45/2004? A lei e, com muito maior razão, a Constituição Federal, não contém expressões inúteis. Não é possível deixar de atribuir significado à atual redação dos incisos I e IV da Constituição Federal, inseridos pela Emenda Constitucional nº 45/2004, verbis:
“Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: I - as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; (...) VI - as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho;”
A competência da Justiça do Trabalho foi alterada e significativamente ampliada. Não por fruto do acaso, mas de tendência que remonta à origem da Constituição Federal em 5.10.1988, que estabeleceu sensível incremento estrutural à Justiça do Trabalho com a previsão de pelo menos um Tribunal Regional do Trabalho em cada estado e no Distrito Federal (art. 112), passando pela Lei nº 10.770 de 21.11.2003 que criou 269 Varas do Trabalho em todo o território nacional.
A alteração imposta pela Emenda Constitucional nº 45/2004 é efetivamente de paradigma. Com base na redação anterior da norma constitucional era corrente a afirmação de que a competência da Justiça do Trabalho era delimitada em razão da qualidade das pessoas litigantes (in, Direito Processual do Trabalho, Wagner Giglio, 10ª Edição, Saraiva, 1997, p. 45).
A partir da Emenda Constitucional nº 45/2004 tornou-se irrelevante a qualidade dos litigantes. A competência não é mais definida em razão da pessoa, mas da matéria. A força inercial causada pelo hábito arraigado dos operadores jurídicos da Justiça do Trabalho de enxergar sempre e invariavelmente o empregado e o empregador nos pólos ativo e passivo das ações, eximindo-se de julgar sempre que isso não ocorre, precisa necessariamente ser rompida. Não há tarefa mais árdua que modificar o modo de pensar dos operadores jurídicos, resistente até mesmo a alterações na Constituição Federal.
A competência da Justiça do Trabalho passou a delimitar-se pela matéria, repita-se que independentemente da qualidade dos litigantes. São as matérias pertinentes à relação de trabalho e os danos morais e patrimoniais oriundos desta relação os critérios eleitos na Constituição para delimitar a competência da Justiça do Trabalho. Entre os diversos danos que em tese podem estar vinculados à relação de trabalho por liame de causa e efeito seguramente o mais relevante é o que atinge a integridade física do trabalhador.
O acidente de trabalho necessariamente nascido na relação de trabalho pode causar danos que se estendem para além do prestador do trabalho e atingem diretamente as pessoas que convivem com o empregado, como seus familiares. Nem por isso o dano deixou de ser “decorrente da relação de trabalho”. Em outras palavras: o relevante não é perquirir se a vítima detém ou não a qualidade de empregado, se está ou não vinculada por relação contratual ao empregador, mas investigar se o dano alegado na petição inicial guarda relação de causa e efeito com o acidente de trabalho e, por corolário lógico imediato, com a relação de trabalho.
É esta a única interpretação que confere efeito e significação jurídica à reforma introduzida pela Emenda Constitucional nº 45/2004 ao acrescentar os incisos I e VI no art. 114 da Constituição Federal.
A distribuição de competência não é aleatória ou fortuita, desvinculada de razão e sentido. As competências são delimitadas levando em conta especialmente a afinidade da matéria com o respectivo ramo do judiciário escolhido e a necessidade de manutenção de coerência lógica visando evitar tanto quanto possível a contradição de decisões calcadas no mesmo fato. O Supremo Tribunal Federal ao reconhecer que é a Justiça do Trabalho a habilitada para decidir sobre a observância das normas de segurança, higiene e saúde dos trabalhadores (Súmula 736), assim como para dirimir os litígios decorrentes de acidente de trabalho (CC 7204-01/MG), atrai para esta Justiça todas as repercussões patrimoniais decorrentes do acidente.
É a reunião em um único ramo do Poder Judiciário das controvérsias fundadas no mesmo fato que permite a aplicação das regras previstas na norma processual destinadas a evitar a contradição de julgamentos (arts. 102 e 103 do CPC). A unidade de convicção que serviu de fundamento para o voto do Min. Cezar Peluso no                   AI 527.105/SP é de extrema relevância para concluir-se pela competência da Justiça                do Trabalho, in verbis:
“É que, na segunda hipótese, em que se excepciona a competência da Justiça do Trabalho, as causas se fundam num mesmo fato ou fatos considerados do ponto de vista histórico, como suporte das qualificações normativas diversas e pretensões distintas. Mas o reconhecimento dessas qualificações jurídicas, ainda que classificadas em ramos normativos diferentes, deve ser dado por um mesmo órgão jurisdicional. Isto é, aquele que julga o fato ou fatos qualificados como acidente ou doença do trabalho deve ter competência para, apreciando-os, qualificá-los, ou não, ainda como ilícito aquiliano típico, para que não haja risco de estimas contraditórias” (grifo nosso).
À Justiça do Trabalho compete pacificamente decidir se no acidente de trabalho estão presentes os requisitos que geram a obrigação de indenizar o dano principal – sofrido pelo empregado – estabelecendo a existência de nexo de causa, culpa ou dolo e o prejuízo e sua extensão. É um total despropósito remeter para outro ramo do Poder Judiciário a averiguação exatamente da presença dos mesmos requisitos em relação a idêntico fato para verificação dos danos reflexos ou por ricochete.
O dano moral reflexo ou por ricochete está umbilicalmente vinculado por relação direta de causa e efeito com o ato ilícito do ofensor. A competência da Justiça do Trabalho em circunstâncias que tais não resultará no conhecimento de controvérsias não íntima e diretamente adstritas ao acidente de trabalho. É o que ensina Sérgio Cavalieri Filho:
“somente o dano reflexo certo e que tenha sido conseqüência direta e imediata da conduta ilícita pode ser objeto de reparação, ficando afastado aquele que se coloca como conseqüência remota, como mera perda de uma chance” (in, Programa de Responsabilidade Civil, 6. Ed., São Paulo: Malheiros, p. 125).
É perfeita a comparação do Juiz Reginaldo Melhado com a única complementação que no caso ora tratado o especialista seria em dano por ricochete e surpreendentemente poderia chegar à conclusão de que a cirurgia não era necessária, verbis:
“É como se um cardiologista fosse chamado a diagnosticar o doente e identificasse uma doença grave, concluindo pela necessidade do transplante cardíaco. Esse médico inicia então a cirurgia. Abre o tórax do paciente e faz o afastamento do esterno. Separa a rede de veias e artérias e liga a circulação sanguínea extracorpórea. Arrancando o órgão enfermo, instala o novo coração. Mas, no momento de religar as artérias e veias, o procedimento é interrompido. O cirurgião é incompetente e o paciente deve procurar um outro médico: o especialista em nexo de causalidade” (in, Justiça do Trabalho: Competência Ampliada, São Paulo: LTr, 2005, p. 413).
Bastam regras ordinárias de bom senso para concluir que a mesma petição inicial que descreve os fatos que geraram o acidente, a existência do nexo de causa e o prejuízo postule o dano sofrido pelo próprio empregado e os respectivos danos por ricochete, ao invés de exigir-se a impressão de nova via de idêntico teor distribuindo-a a Juízos diferentes, com flagrante possibilidade de decisões contraditórias.
A Constituição Federal ao estabelecer o direito dos trabalhadores a seguro contra acidentes de trabalho sem excluir a indenização quando o empregador incorrer em dolo ou culpa torna clara a preocupação em disciplinar questão social de alta relevância. São conhecidas as estatísticas da Organização Internacional do Trabalho de que a cada minuto três trabalhadores morrem no mundo como resultado de condições inseguras de trabalho. A atração da competência para dirimir os litígios decorrentes dos acidentes de trabalho para a Justiça do Trabalho é a garantia de eficácia da norma material constante no art. 7º, XXVIII da CF/88.
A interpretação das normas constitucionais deve buscar conferir o máximo de eficácia aos seus preceitos, notadamente em se tratando de direitos sociais. Por isso, repugna ao sistema constitucional qualquer interpretação que restrinja os efeitos do acréscimo de competência da Justiça do Trabalho promovido pela Emenda Constitucional nº 45/2004. Vejamos a este respeito a lição de J. J. Gomes Canotilho ao discorrer sobre o princípio da máxima efectividade:
“Este princípio também designado por princípio da eficiência ou princípio da interpretação efectiva, pode ser formulado da seguinte maneira: a uma norma constitucional deve ser atribuído o sentido que maior eficácia lhe dê. É um princípio operativo em relação a todas e quaisquer normas constitucionais, e embora a sua origem esteja ligada à tese da actualidade das normas programáticas (Thoma), é hoje sobretudo invocado no âmbito dos direitos fundamentais (no caso de dúvidas deve preferir-se a interpretação que reconheça maior eficácia aos direitos fundamentais)” (in, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 2. Ed, Livraria Almedina, Coimbra, 1998, p. 1097 – grifo no original).
Neste sentido a regra processual de distribuição da competência deve ser interpretada em estrita consonância com a estatura e relevância constitucional e social o direito material controvertido, sempre voltado a conferir a mais célere e, por isso, eficaz proteção ao bem da vida pretendido pela parte. Dada às características próprias da Justiça do Trabalho, a distribuição da competência é de significativa relevância para a concretização do direito constitucional previsto no art. 7º, XXVIII.
Vale transcrever a lição de Luiz Guilherme Marinoni:
“há que entender que o cidadão não tem simples direito à técnica processual evidenciada na lei, mas sim direito a um comportamento judicial que seja capaz de conformar a regra processual com as necessidades do direito material e dos casos concretos. É óbvio, não se pretende dizer que o juiz deve pensar o processo civil segundo seus próprios critérios. O que se deseja evidenciar é que o juiz tem o dever de interpretar a legislação processual à luz dos valores da Constituição Federal. Como esse dever gera o de pensar o procedimento em conformidade com as necessidades do direito material e da realidade social, é imprescindível ao juiz compreender as tutelas devidas ao direito material e perceber as diversas necessidades da vida das pessoas” (grifo nosso – in, Técnica Processual e Tutela dos Direitos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 244).
O presente processo é exemplo flagrante da maior eficácia da norma constitucional quando a solução da controvérsia é submetida à Justiça do Trabalho. Os autores ajuizaram na data de 18.05.2004 a reclamação trabalhista nº 00433-2004-512-04-00-6 postulando os direitos do de cujus violados no curso do contrato de trabalho. A presente demanda é ajuizada em 17.05.2004 na Justiça Comum Estadual: um dia antes da reclamação trabalhista.
Na reclamação trabalhista a sentença foi proferida em 30.11.2005, da qual a reclamada interpôs recurso ordinário julgado em 5.09.2006, sendo que no momento da elaboração da presente sentença a reclamada tem ciência dos cálculos elaborados pelo Perito nomeado pelo Juízo. Vale dizer: no tempo que a reclamação trabalhista levou para ser instruída e julgada no primeiro e segundo graus de jurisdição, o presente processo tramitou apenas para dirimir-se questão preliminar na Justiça Comum Estadual acerca do Juízo competente.
Suscitar conflito de competência como quer a reclamada equivale a postergar indefinidamente a satisfação do direito pretendido pelos autores. Significa deixar ao desabrigo por tempo definitivamente fora da razoabilidade uma viúva e um menor que perderam o pai em acidente de trabalho.
Por todo o exposto, rejeita-se a preliminar de incompetência material suscitada pela reclamada.

Um comentário:

  1. Lídia Alves Ponciano - DPT-I

    Para a preservação da dignidade da pessoa humana, previsto no art. 1º, III da Constituição Federal, nada mais justo do que a Justiça do trabalho processar e julgar matérias relacionadas a danos morais em uma relação de trabalho. Afetaria esse princípio já mencionado se no meio do processo, o juiz remetesse a justiça comum, alegando incompetência para julgar a matéria. Então aconteceria o que foi mencionado no texto acima: “É como se um cardiologista fosse chamado a diagnosticar o doente e identificasse uma doença grave, concluindo pela necessidade do transplante cardíaco. Esse médico inicia então a cirurgia. Abre o tórax do paciente e faz o afastamento do esterno. Separa a rede de veias e artérias e liga a circulação sanguínea extracorpórea. Arrancando o órgão enfermo, instala o novo coração. Mas, no momento de religar as artérias e veias, o procedimento é interrompido. O cirurgião é incompetente e o paciente deve procurar um outro médico: o especialista em nexo de causalidade (in, Justiça do Trabalho: Competência Ampliada, São Paulo: LTr, 2005, p. 413, citado por A indenização por danos em caso de falecimento do trabalhador (legitimidade),disponível em http://trabalhoemvoga.blogspot.com.br/2012/09/a-indenizacao-por-danos-em-caso-de.html#comment-form)". Seria um total desrespeito quanto a parte interessada na matéria. Deve haver coesão e coerência nos julgamentos, além de, lógica na seleção das questões que são de competência de determinada justiça. Portanto, também deve incidir um juízo de valor, já que vidas dependem da determinada sentença.

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